Coluna #16: A disrupção chega aos esportes

Em 2013, um atleta sul-coreano, Kim Dong-hwan, obteve um visto P-1A, para os Estados Unidos. É um tipo de autorização diplomática reservada apenas para “atletas reconhecidos internacionalmente”. Sua modalidade esportiva? StarCraft II.

Rapidamente a modalidade de competição em esportes virtuais – conhecidos em inglês como esports – vem ganhando tração. Num mundo cada vez mais povoado por nativos digitais, existe pouca distinção entre esportistas tradicionais e os virtuais. A dedicação, o treino, a dieta, e até a torcida – as semelhanças são muitas. Franquias populares incluem League of Legends, Dota, Counter-Strike, Overwatch, Super Smash Bros., Starcraft, entre incontáveis outras.

E onde existe interesse, existe dinheiro para ser feito. O mercado de esports começou relativamente pequeno, ao redor de um nicho. Em 2014, gerava receitas da ordem de 200 milhões de dólares, mas cresceu velozmente. Um estudo recente da PricewaterhouseCoopers indicou que os gastos com esports devem expandir, na média, 18,3% ao ano entre 2018 e 2023, para chegar a quase 1,8 bilhão de dólares. No mundo pós-pandemia, com o cancelamento de diversos eventos esportivos (não-virtuais), esse número já parece bastante subestimado.

Até as faculdades já estão se adaptando. Enquanto muitos estudantes na escola de negócios francesa EMLyon tiveram suas aulas canceladas ou férias decretadas, os alunos de uma das classes do curso de pós-graduação em Administração não tiveram nenhuma interrupção. O curso eletivo em esports, com foco em gestão, teve 30 inscritos em 2019. A nova turma que se inicia em setembro deve ter 100 novos estudantes. O fenômeno não é exclusivo a Lyon: cursos parecidos têm surgido em cerca de uma dúzia de universidades na Europa, nos EUA e na Ásia.

O mercado de esports está em pleno desenvolvimento, e ainda não se sabe qual tipo de modelo de negócios irá prosperar. A tentação de estabelecer referências com os mercados de esportes tradicionais é óbvia, mas será interessante ver como as normas se adaptam numa era de hiperconectividade. Por exemplo, as linhas de receita de ingressos em estádio fazem pouco sentido para esports, apesar de existirem algumas arenas nas quais torcedores podem assistir os jogadores estando fisicamente próximos. A Riot Games, criadora do League of Legends (LOL), cobrou 15 dólares para um ingresso virtual “premium”, que possibilitava a visualização de múltiplos streams simultâneos e a criação de experiências personalizadas para os fãs. As receitas do ingresso premium foram divididas entre as ligas regionais de LOL e os times.

Assim como nos esportes tradicionais, outra linha de receita significativa se dá por patrocínios. A Toyota, por exemplo, decidiu fazer uma parceria com a Blizzard Entertainment. Criou um documentário sobre a liga do Overwatch, mostrando seus veículos. Pode fazer sentido para empresas que desejem apelar para públicos específicos, especialmente se o recorte for entre a população mais jovem e na Ásia, onde esports já são bastante populares.

A tração ao redor dos esports (tanto pela sua popularidade quanto por seu potencial de mercado) é tanta que a pressão já se fez sentir sobre o Comitê Olímpico Internacional (COI). O Japão, com sua reputação como uma das capitais globais da indústria de videogames, já gostaria de ter algo nas Olimpíadas de Tóquio, adiadas para 2021. As discussões estão mais avançadas para as Olimpíadas de Paris, em 2024. Esports competitivos poderiam ser considerados uma atividade esportiva, segundo o COI, contanto que fossem aderentes às regras e normas do movimento olímpico – o que, basicamente, inviabilizaria jogos violentos.

Para os investidores, as implicações são muitas, e as oportunidades também. Nos mercados globais, existem diversas empresas listadas com exposição ao setor de esports. A Activision Blizzard (NASDAQ:ATVI), por exemplo, é dona das franquias de Overwatch, Call of Duty e World of Warcraft. A Tencent Holdings (listada em Hong Kong sob o ticker 0700), detém as franquias de LOL e Fortnite. Temos também a Take-Two Interactive (NASDAQ:TTWO), dona do Grand Theft Auto, e a Electronic Arts (NASDAQ:EA), que detém as marcas de Battlefront e Star Wars.

O mercado ainda é pequeno, e para quem cresceu no país do futebol, incluir os esports como uma franquia de esporte “de verdade” pode parecer como algo um pouco forçado. Mas o mundo em 2020 parece cada vez mais distante daquele no qual nascemos. Se você ainda precisar se convencer, vale pedir a opinião de seu sobrinho adolescente. Garanto que irá mudar de ideia.

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